Fogo

Fogueira

A descoberta dos modos de obtenção do fogo foi uma das mais importantes para a sobrevivência da humanidade. Desconhece-se, no entanto, desde quando é que se conseguiu obter fogo artificialmente. Na China, em Chukutien, o Sinanthropus, um hominídeo (cerca de 150 000 anos a. C.), foi descoberto com um resto de cinzas, este facto pode ser demonstrativo de que este hominídeo já conhecia o processo de obtenção de fogo.
O fogo deve ter sido, inicialmente, obtido de modo indirecto, isto é, derivado de um acidente natural: um raio, um vulcão ou outro. Há várias formas de produzir fogo artificialmente: por exemplo, os índios norte-americanos, os polinésios e algumas tribos da África central obtêm fogo através do método de fricção de dois paus, quer por rotação, quer por serração; nos Aleútes (ilhas situadas na costa noroeste da América do Norte) e no México usavam o método de percussão (faísca obtida como resultado do choque entre duas pedras que se propaga a uma matéria facilmente inflamável - é, no fundo, o método que ainda hoje se usa nos isqueiros). Outros modos de obtenção de fogo, mas mais recentes, são a electricidade ou os produtos químicos combustíveis.
A descoberta do fogo foi uma autêntica revolução nos costumes do homem. Desde logo pôde deixar de comer carne crua e passar a comer carne cozinhada, este acontecimento não deixou de ter consequências fisiológicas, a nível dentário ou a nível do aparelho digestivo. O fogo permitiu ainda o trabalho sobre os metais, que terá implicações tanto em termos bélicos como em termos de agricultura, respectivamente, através do fabrico de armas para a guerra e de instrumentos úteis para o cultivo da terra. Assistimos ao surgimento de diversos progressos técnicos associados à utilização do fogo: fractura de materiais duros (pedra, chifre de cervos), no Paleolítico inferior ou médio, e endurecimento ao fogo de armas de madeira (Paleolítico médio). Mas é com o Paleolítico superior que a utilização do fogo se intensifica: oxidação dos corantes, cozedura de estatuetas de pastas maleáveis, aquecimento do sílex para facilitar o talhe, modulação a quente dos chifres de cervo, sem esquecer a iluminação através de lamparinas de pedra e tochas, com intuitos mistos de aquecimento e auxílio na caça. Este domínio do elemento vai permitir o evoluir no sentido das verdadeiras "artes do fogo", a cerâmica, a vidraria e a metalurgia, surgidas com o Neolítico e a Idade do Bronze.
Mas a descoberta do modo de obtenção do fogo não teve apenas implicações materiais, teve também implicações espirituais. O fogo, elemento poderoso, capaz de iluminar e aquecer a um só tempo passou a ser tomado como o símbolo por excelência da divindade. Não se pode afirmar que estes povos adorassem o fogo em si mesmo, mas antes que viam nele, nas características que dele dimanam, uma representação de Deus; seria também um símbolo da vida em si mesma ou da alma, uma vez que este se serve de uma matéria que consome até ao fim para se manifestar, do mesmo modo que a vida se serve de um corpo para se tornar patente e o consome até à morte. Da importância que o fogo tinha nos cultos divinos julga-se facilmente observando o seu papel desde a mais alta antiguidade: o Lar dos Árias; o Prometeu dos gregos; os deuses Lares ou Penates dos romanos ou as Vestais, sacerdotisas que tinham por missão manter o fogo sagrado sempre aceso nos templos dedicados a Vesta; o Agni do Hinduísmo; o fogo sacrificial entre os judeus; o Espírito Santo entre os Cristãos. Há ainda vestígios pagãos adoptados e adaptados pelo cristianismo, como o das fogueiras de São João, que decorre no Solstício de Verão, como já decorria com o deus Janus.
No Zodíaco ocidental, existem três signos que pertencem a este elemento: o Carneiro, o Leão e o Sagitário, cujos nativos são dotados de grande entusiasmo, força de decisão e fé.
Desde a antiguidade clássica que o fogo aparece como o mais subtil dos quatro elementos (do mais grosseiro ao menos denso, respectivamente, a terra, a água, o ar e o fogo); destes elementos, o fogo é o único que manifesta uma tendência puramente ascendente, enquanto que o ar se espalha horizontalmente para cima, a água espalha-se horizontalmente para baixo e a terra tende, como movimento essencial, para a queda. O fogo aspira ao superior, queima a sua matéria sempre apontando a direcção do céu, do espírito. É ainda de destacar o mito do Prometeu que demonstra que a importância do fogo é tão grande que era zelosamente guardado pelos deuses e que só um roubo foi capaz de o entregar aos homens. Roubo este que não deixou de ter como castigo uma pena eterna: Prometeu agrilhoado a uma rocha para todo o sempre, com um abutre comendo-lhe o fígado que se renova a todo o momento. Este castigo terrível, que o mito representa, é suficiente para se perceber da importância que a descoberta do processo de obtenção do fogo teve, uma vez que deixou de ser posse exclusiva dos deuses, que enviavam o trovão ou acordavam os vulcões.

Referências do Documento:
  • fogo. In Diciopédia 2010 [DVD-ROM]. Porto : Porto Editora, 2009. ISBN: 978-972-0-65265-2

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