A Biotecnologia é uma área interdisciplinar que tem por base a manipulação de
células vivas e/ou das moléculas que as compõem, utilizando uma diversidade de
técnicas científicas, por forma a obter um determinado produto, efeito ou
resolução para um problema, com interesse antropológico.
Desde sempre o homem utilizou técnicas de manipulação dos sistemas biológicos
naturais, cruzando determinados animais ou semeando apenas determinados tipos
de plantas, portadores de certas características com interesse. Mas outras
técnicas mais elaboradas são utilizadas já desde as antigas civilizações
Egípcia e Mesopotâmica, nas quais era vulgar o recurso à utilização de
microrganismos fermentativos (determinados tipos de leveduras e bactérias) para
o fabrico, praticamente industrial, de alguns produtos alimentares, como a
cerveja, o pão e o queijo. No entanto, mau grado a grande utilização destas
técnicas desde tempos imemoriais, o grande desenvolvimento da Biotecnologia
deu-se, sobretudo, nos últimos trinta anos, estando esses progressos
estritamente associados a desenvolvimentos de uma nova área da Biologia,
nomeadamente da Genética: a Engenharia Genética.
A Engenharia Genética caracteriza-se pela manipulação do ADN (Ácido
Desoxirribonucleico), o material hereditário presente em todas as células dos
seres vivos, responsável pela expressão de todas as características
hereditárias dos indivíduos. Esta manipulação é feita através do corte das
cadeias do ADN por enzimas específicas (enzimas de restrição), as quais,
quebrando a cadeia de ácidos nucleicos em locais bem definidos, permitem que
outras enzimas (Ligases) realizem a inserção de um (ou mais) genes, previamente
seleccionados e isolados do ADN de outros organismos, o qual é responsável pela
produção de um determinado produto, ou a expressão de uma determinada característica
com interesse, voltando a fechar a cadeia de ADN. Deste modo, conseguem-se
obter organismos transgénicos, isto é, com um património genético alterado,
possuidores de genes que não eram inicialmente típicos da espécie (por exemplo,
a inserção de genes que conferem resistência a determinados herbicidas ou
bactérias, em espécies de cultivo, como o milho), e que agora se passam a
transmitir de geração em geração, juntamente com o restante ADN da espécie.
Os desenvolvimentos da Engenharia Genética estão intimamente ligados aos
desenvolvimentos em outras áreas, como a Genética, a Biologia Celular, a
Química, a Física e a Microscopia.
A primeira experiência de Engenharia Genética data de 1944, data em que o
americano Avery conseguiu, pela primeira vez, a introdução de ADN estranho em
células de Pneumococus (género de bactérias), transmitindo-se a
informação por ele codificada de geração em geração. No entanto, foi necessário
esperar mais vinte e cinco anos para que investigadores da Universidade de Harvard
conseguissem isolar um determinado gene específico (porção de ADN responsável
pela expressão de uma determinada característica definida), na bactéria Escherichia
coli. Ao entrar na década de 70, estavam então definitivamente abertas as
portas à selecção de genes e sua reinserção em outros organismos, formando-se,
sobretudo já na década de 80, um novo ramo industrial, responsável pela
aplicação da Engenharia Genética à produção industrial de produtos
diversificados, geneticamente alterados, como por ex., variedades de plantas de
cultivo resistentes a pragas infestantes ou herbicidas e tomateiros que
produzem frutos resistentes ao apodrecimento.
As diferentes áreas de trabalho da Biotecnologia (Engenharia Genética, Cultura
de Células e Tecidos, Engenharia de Proteínas e de Produtos Alimentares, etc.)
são responsáveis por progressos em inúmeras áreas científicas, assim como por
alguns dos produtos que consumimos no dia-a-dia. Vejamos alguns exemplos da
aplicação da Biotecnologia em diferentes campos:
-
Medicina: produção de hormonas
(por exemplo: insulina e hormona de crescimento (GH, Growth Hormone) -
antes da aplicação das técnicas de Engenharia Genética, era necessário, para
produzir apenas uma dose de GH, a disponibilidade de cinquenta glândulas
pituitárias de cadáveres); desenvolvimento de Vacinas; testes de gravidez;
desenvolvimento de antibióticos; terapia e rastreio genético; produção de
tecidos humanos em cultura.
-
Indústria Alimentar: produção de
pão, bebidas alcoólicas e produtos lácteos; frutos resistentes ao
apodrecimento; alimentos enriquecidos em nutrientes essenciais (particularmente
úteis nos países de onde a diversidade alimentar se limita a um a dois
alimentos diferentes) e até mesmo fármacos integrados em produtos alimentares
(por exemplo: vacinas).
-
Agricultura, Pecuária e Pesca:
desenvolvimento de variedades vegetais resistentes à seca, pragas e uso de
herbicidas químicos; criação e selecção de variedades de plantas e animais mais
produtivas; crescimento rápido de animais (por exemplo, peixes e galinhas)
destinados a produção alimentar; aumento da produção de leite.
-
Preservação do Ambiente:
preservação do ADN de espécies em risco de extinção para estudo e até possível
clonagem; análise e reconstituição de características de seres vivos extintos
por análise de ADN; produção de bactérias capazes de digerir hidrocarbonetos
(importante no caso dos derrames de petróleo); redução da desflorestação por
diminuição da área necessária à agricultura, graças ao aumento da produtividade
das culturas; abandono do uso de pesticidas, por criação de variedades vegetais
naturalmente resistentes; criação de bactérias capazes de funcionarem como
biofiltros, absorvendo poluentes provenientes de chaminés industriais.
-
Indústria química: produção de
detergentes; uso de certas estirpes de bactérias como agentes extractores de
determinados minerais preciosos a partir de meios com baixa concentração,
usando a sua capacidade de concentrarem determinados elementos minerais no seu
interior;
-
Indústria Informática: desenvolvimento
dos chamados computadores orgânicos, que utilizam células nervosas na
elaboração de chips de memória e processamento.
Embora os benefícios decorrentes do uso das biotecnologias sejam por demais
evidentes, existem, no entanto, alguns receios e críticas relativamente à
utilização de algumas técnicas e procedimentos, quer de carácter ético,
nomeadamente no campo da criação de cópias completas de seres vivos (clonagem),
quer ambiental, sobretudo no que diz respeito à produção de variedades de seres
vivos geneticamente alterados, cujo impacto na imensa complexidade que são os
ecossistemas naturais nunca pode ser totalmente determinado, podendo a vantagem
competitiva conferida artificialmente a determinadas espécies ser o suficiente
para provocar extinções em massa de outras. As alterações em hábitos naturais
das espécies, por interferência humana, pode também ser um factor cujo impacto
negativo é desconhecido. Veja-se o exemplo dos bovinos, naturalmente herbívoros
e, no entanto, alimentados com rações que incluem restos de outros animais da
mesma espécie: este tipo de canibalismo, segundo alguns cientistas, poderá
estar na origem do prião causador da BSE (encefalopatia espongiforme bovina), a
conhecida "Doença das Vacas Loucas", motivo pelo qual a União
Europeia proibiu o uso de restos de animais na elaboração de rações para
bovinos.